António da Silva Rodrigues: de aprendiz a líder que nunca esqueceu a bancada

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António da Silva Rodrigues é um símbolo da indústria da região e do país

>O homem que moldou empresas, vidas, a região e a indústria

A vida de António da Silva Rodrigues é a história de uma ascensão improvável: o rapaz da aldeia de Ul que começou por limpar oficinas e afinar moldes tornou-se no fundador de um dos maiores grupos industriais portugueses. Fez-se serralheiro, patrão, líder e referência — mas nunca deixou de ser o homem que entrava na fábrica cedo, cumprimentava todos por igual e acreditava que “o sucesso maior passa por ter funcionários em condições”.

INFÂNCIA HUMILDE: UMA VIDA MOLDADA ANTES DO AÇO
António da Silva Rodrigues nasceu em 1942, em Ul, uma freguesia rural de Oliveira de Azeméis onde o tempo se media pelo ciclo das colheitas e onde o trabalho começava antes da adolescência. Era um ambiente de agricultores, de casas de pedra e de vidas duras, onde as crianças aprendiam cedo que o dia só terminava quando tudo estava feito.
Aos dez anos já ajudava os avós nos campos, carregando água, cavando terra, apanhando lenha, fazendo aquilo que fosse preciso. A escola não ia além da quarta classe — não por falta de vontade, mas porque a economia familiar assim o exigia. A infância de António foi uma escola de resistência, disciplina e humildade. E isso marcaria tudo o que viria depois.

O ENCONTRO COM A OFICINA: 14 ANOS E UM DESTINO ALINHADO
Aos catorze anos entrou pela porta de uma serralharia local — uma oficina pequena, com chão de cimento gasto, ferramentas alinhadas em paredes improvisadas e o cheiro característico do aço acabado de polir. Para muitos, era apenas um emprego, para António foi a revelação de um mundo.
Naquele tempo, a aprendizagem fazia-se a olhar e a repetir. Começou por tarefas simples, mas essenciais: varrer, limpar bancadas, lavar as casas de banho da fábrica. Pouco a pouco passou à bancada. Observava os serralheiros mais experientes, as mãos firmes que moldavam peças com micrómetros, limas e cinzéis. E fazia perguntas. Tantas perguntas que, segundo antigos colegas, “ele aprendia mais depressa do que conseguíamos ensinar”.
Foi aí que descobriu a vocação: a precisão. O rigor. A paciência para trabalhar aço até ele obedecer.

A MOLDOPLÁSTICO: O TRABALHADOR Nº 1
Daquela primeira oficina passou para a Moldoplástico, uma das empresas pioneiras de moldes da região. E fica registado — literalmente — como o trabalhador n.º 1 da folha de salários.
Na Moldoplástico, encontrou ajustadores vindos da indústria vidreira, homens de um rigor quase obsessivo, habituados a trabalhar moldes que dependiam de centésimos de milímetro. A convivência com esses mestres deu-lhe a base técnica que mais tarde se tornaria marca da Simoldes.
Era ainda um miúdo, mas já ganhava respeito. Fazia tudo: montava moldes, ajustava peças, corrigia imperfeições invisíveis para olhos comuns. E, acima de tudo, aprendia.

A CISÃO QUE MUDOU TUDO: O AVÔ, UM TIO E TRÊS RAPAZES
Nos bastidores da Moldoplástico, mudanças societárias criaram tensões. O avô de António, Manuel Carreira, decidiu sair e criar uma nova oficina. E levou consigo três jovens que tinham no aço a mesma dedicação. Tinha António 17 anos apenas. Mas já era indispensável.
Foi assim que, em 1959, nasceu a oficina que viria a transformar-se no Grupo Simoldes.
A primeira oficina era pequena, acanhada, quente no verão e gelada no inverno. As máquinas eram poucas: uma fresadora, um torno antigo, algumas prensas. O resto fazia-se com as mãos. Não havia sala de gabinetes, nem escritório digno desse nome. Havia trabalho… muito trabalho.
A oficina começou por fabricar ferramentas e moldes simples, mas com um rigor que começou a chamar atenção. António trabalhava de madrugada, almoçava na bancada e voltava à produção sem perder tempo. O jovem serralheiro era, já nessa altura, o coração operativo do projeto.

OS ANOS 60: AZEMÉIS DESPERTA INDUSTRIALMENTE
A década de 60 foi marcada por um fenómeno que hoje faz parte da história local: o surgimento sucessivo de pequenas oficinas de moldes em Oliveirade Azeméis. A herança da indústria vidreira — que formara ajustadores de competência invulgar — juntou-se ao crescimento da metalomecânica e ao aparecimento dos primeiros agentes internacionais.
A oficina fundada por Manuel Carreira acompanhou este movimento. Em 1963 mudou-se para uma fábrica de dois pisos em Cidacos, com três dezenas de trabalhadores. Para António, significava mais responsabilidade. Já não era apenas técnico: era líder de equipa, solucionador de problemas, referência.

OS ANOS 70: PRIMEIRO AO ESTRANGEIRO, DEPOIS AO MUNDO
A década de 70 trouxe a primeira grande viragem. Com moldes cada vez mais precisos, a empresa começou a exportar para Suécia e Estados Unidos — algo extraordinário para oficinas portuguesas da época.
Os clientes estrangeiros chegavam através de agentes, mas o mérito estava no produto.
Um episódio marcante é recordado por antigos colaboradores: à porta da empresa apareceu um agente norte-americano, desesperado porque um molde feito em Portugal estava perdido. Perguntou por Manuel Carreira; encontrou António. E António resolveu o problema. Era o início de uma relação que abriria portas a exportações regulares.
Em 1974, a fábrica tinha novo edifício. E no próprio dia 25 de Abril, às oito da manhã, a luz foi finalmente ligada e a produção arrancou.
O país vivia a Revolução; mas na Simoldes, a prioridade era pôr máquinas a trabalhar.

O LÍDER QUE NUNCA ESQUECEU A BANCADA
Com o crescimento, António assumiu funções de direção. Mas nunca deixou a bancada. Chegava à fábrica cedo, muitas vezes antes da equipa de limpeza, e percorria cada secção. Cumprimentava trabalhadores pelo nome, perguntava por famílias, oferecia ajuda onde fosse preciso.
Não existia distinção rígida: para António, operários, técnicos e engenheiros estavam no mesmo nível humano. Dizia frequentemente: “Sinto-me uma peça da máquina. Não sou mais do que eles.”
“O sucesso maior passa por ter funcionários em condições.”
A cultura que criou — respeito, proximidade, exigência — fez com que muitos trabalhadores fizessem ali toda a carreira. As histórias de 30, 40 e até 45 anos de casa eram regra, não exceção.

ANOS 80 E 90: A CONSTRUÇÃO DE UM GIGANTE INDUSTRIAL
Ao entrar nos anos 80, a empresa estava preparada para crescer. E cresceu.
A ligação ao setor automóvel consolidou-se e a Simoldes tornou-se fornecedora de grandes marcas europeias. Vieram novas unidades, novas máquinas, novas equipas.
A expansão internacional começou a ganhar corpo: França, Alemanha, Brasil, República Checa, México. Mas António Rodrigues manteve um princípio inegociável: o centro de decisão ficaria sempre em Oliveira de Azeméis. Podia trabalhar para o mundo, mas pertencia à terra.
Ao longo da vida, António teve uma postura firme diante das crises económicas. Quando outros cortavam custos, ele investia. Quando o mercado desacelerava, ele acelerava. Quando havia incerteza, ele dizia: “Agora é que é preciso avançar.” 
Essa coragem pragmática — nunca impulsiva, sempre ponderada — permitiu ao grupo estabilizar em fases difíceis e crescer quando as oportunidades surgiam.
 

Reconhecimento e legado
António da Silva Rodrigues fez-se serralheiro, patrão, líder e referência com a expansão do Grupo Simoldes, sempre a partir de Oliveira de Azeméis.
Em 2006, recebeu a Ordem de Mérito Industrial, distinção que o reconhecia como um dos maiores industriais portugueses. Mas a condecoração não mudou nada no dia seguinte: continuou a chegar cedo, a cumprimentar todos e a verificar moldes na bancada quando necessário.
Para colaboradores e clientes, António era um líder sério, discreto e de palavra firme. Para a região, era mais do que isso: era um símbolo, um legado moldado na terra e nas pessoas.
Hoje, a história de António da Silva Rodrigues é contada como a de um homem que transformou uma oficina de 80 metros quadrados num grupo multinacional — mas seria injusto resumi-la apenas aos números.
O seu verdadeiro legado está nas pessoas que formou, na cultura que deixou, na região que ajudou a projetar, na prova viva de que uma vida começada no campo pode chegar longe se for guiada pelo trabalho, pela humildade e pelo rigor.
 

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