20 Jun 2022
“Valores económicos oliveirenses”
Mão amiga proporcionou-me a leitura da primeira edição, de 9 de Abril de 1925, do semanário oliveirense “A Defesa”. Composto e impresso na Escola Tipográfica das Missões de Couto de Cucujães, teve como impulsionador e director o engenheiro Mário Borges, esquecido oliveirense adoptivo a quem muito devemos e cuja vida abordarei em breve; foi editor um outro perfilhado, o reconhecido mestre de fotografia Eduardo Paul.
A chamada Primeira República vivia o estertor que conduziria, pouco mais de um ano depois, ao golpe militar de 28 de Maio. Razões, talvez, para o lançamento do jornal, tema obrigatório com a escolha óbvia do articulista Bento Carqueja, conterrâneo ilustre e, mais que isso, consagrado Mestre de Economia Política.
Após lamentar – já na época! – o abandono da agricultura, Bento Carqueja desenvolve :
“Se da agricultura passarmos à indústria, a perspectiva é mais animadora. O concelho possui verdadeiros valores industriais. A primeira, sob o ponto de vista cronológico, é a indústria do vidro, aqui implantada já no século XV, favorecida por privilégios reais, de que Sousa Viterbo colheu e publicou interessante notícia. Os seus produtos rivalizam com os de qualquer procedência, nacional ou estrangeira.
A indústria de chapelaria, com o seu núcleo em São João da Madeira, tem capacidade bastante para abastecer, só por si, todo o país e colónias, empregando, como emprega, os processos mecânicos mais aperfeiçoados.
A serração, a marcenaria, o calçado, a preparação de frutas, o papel, as minas, tudo isto representa ramos industriais de grande valor na actividade oliveirense.
Atravessam, em geral, essas indústrias, presentemente, uma crise manifesta. Essa crise é o reflexo da crise monetária em que nos debatemos, desde 1891, e que, desgraçadamente, se tem agravado, sem que os governos tenham a devida compreensão da necessidade de dar remédio a tão grande mal.
A perturbação exercida no trabalho nacional faz-se sentir principalmente nas regiões, como o concelho de Oliveira de Azeméis, onde a indústria representa grandes valores e ocupa numerosos braços.
Reclamemos, pois, que os governos mudem radicalmente de processos políticos e transformem os seus processos de política facciosa em processos de política económica, cumprindo um dever patriótico.
A indiferença seria o pior de todos os sintomas, no momento gravíssimo que atravessamos. Correspondia ao paroxismo do suicida que não vê senão na morte a solução para o seu desespero.
Defesa calorosa, intensa, persistente dos valores económicos, devem, pois, realizar todos quantos tenham a justa compreensão de que Portugal só pode resolver a presente crise e salvar-se dos opróbrios que o ameaçam produzindo mais, produzindo muito, produzindo cada vez melhor. Está nisto, só nisto, a salvação nacional”.
A História ensina-nos que o apelo não foi ouvido…
(Escrito de acordo com a anterior ortografia)