11 Apr 2022
Gonçalo M. Tavares, no seu livro ‘Atlas do Corpo e da Imaginação’, a propósito de ‘respiração e ética’, refere que ‘a ética não é mais do que a decisão primeira de não viver de qualquer modo, de não deixar que as circunstâncias determinem, a cada momento, as ações do indivíduo’.
Pressinto que deixámos de perseguir aquele verdadeiro objetivo, ou seja, decidir não viver de qualquer modo. Sinto, todos os dias, que se está a perder o rumo por entre os dedos das mãos, quando estamos, em sociedade, perante a acção. Parece que nada nos une, efetivamente. E, certamente, quem tira proveito desta situação são algumas pessoas que, deliberadamente ou não, usufruem da distração da maioria...
Conto-vos, aqui, um episódio insólito:
Um operário de uma obra, que se iniciou por estes dias, na Rua Professor António Costeira, ‘ordenou-me’ para inverter a marcha, dizendo para não passar. Não reconheci naquele senhor a autoridade pública para que tal ordenação fizesse sentido e muito menos verifiquei a existência de sinais de trânsito que pudessem indicar ou confirmar o significado daquela ordenação.
Perante tal situação, decidi telefonar à Guarda Nacional Republicana (GNR). Nesse telefonema identifiquei-me e perguntei se havia indicação, naqueles serviços, sobre a interrupção de circulação naquela rua, prevista para aquele dia. A resposta foi a mesma de sempre: não sabemos de nada. Segundo a GNR, os serviços da Câmara Municipal não comunicam com os serviços da GNR e não têm o cuidado de avisar a GNR previamente. Por isso, a situação era ilegal, segundo o agente que atendeu a chamada.
Reparem, caros leitores: os arruamentos foram sendo construídos com imenso sacrifício por parte de cada um de nós e dos nossos antepassados. O seu planeamento e a sua construção são pagos com os nossos impostos. A possibilidade de determinado traçado existir, em qualquer parte do nosso território, deve-se, justamente, à cedência de terrenos, ora expropriados ora construídos pelo próprio proprietário do terreno, como aconteceu, por exemplo, na Rua Doutor Professor Ângelo da Fonseca, aberta, nos anos cinquenta, por Augusto Valente. Aliás, aproveito a ocasião para salientar a perplexidade sentida quando a decisão relativamente à atribuição do nome daquela rua, por parte dos serviços camarários, não ter recaído, justamente, no nome do responsável pela sua existência: Augusto Valente.
Mas, voltando ao tema, os arruamentos têm um objetivo maior: garantir o bem público, garantir mobilidade e bem-estar às populações, seja individualmente seja às empresas e serviços.
Assim, a interrupção de uma via pública levada a cabo por um privado, sem ser acautelado pelas forças de segurança pública, garantindo o bom funcionamento do serviço e bem-estar da população, é, no mínimo, abusivo e, por sinal, ilegal.
Talvez um pouco de ética nas nossas vidas evitasse muitos aborrecimentos que todos nós sentimos, uma vez que as coisas não podem ser de qualquer modo.
* Arquiteta, O. Azeméis
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