9 Dec 2024
António Magalhães
A fotografia mostra-nos a fonte do Cruzeiro, em Macinhata da Seixa, junto à abandonada escola, inaugurada em 1903, após porfiados esforços e o contributo de beneméritos, mesmo ao lado do multissecular cruzeiro de granito que lhes terá dado o nome.
A memória do povo diz-nos que jamais secou, pelo menos há setenta anos posso garanti-lo. Ao contrário da fonte da Taipa, que estancava aos primeiros sinais do Verão. Quando a distribuição da água vinha longe – aliás alinda não chegou a toda a freguesia – as mulheres, principalmente estas, alinhavam em fila os canecos, esperando que lhes chegasse a vez. (Só os mais velhos podem recordar o caneco, vasilha em aduelas de madeira, que, embora pesada, tinha a vantagem da duração).
As sobras pertenciam ao vizinho e fertilizavam uma hoje abandonada quinta, que então se multiplicava em hortaliças, pasto para o gado e fruta. E eram tão valiosas essas sobras, que o dono não gostava que alguém regasse com elas o jardim, já que, na sua opinião, só poderiam ser gastas no consumo doméstico. E parece que tinha razão.
São recordados ainda os conflitos entre a Câmara e a Junta, por um lado, o dono das sobras pelo outro.
Muitos ali se lavaram, incluo-me entre eles. Os alunos da escola ali se dessedentaram, lavaram o esfregão com que limparam a ardósia, único material ao seu dispor.
Não sei se alguma vez a água foi analisada. Penso que não. Mas a população está avisada. No entanto, alguns resistentes, gente de fé, continuam a consumi-la, fiéis ao velho princípio de que “água corrente não mata gente”.
E a água da fonte do Cruzeiro, que, em verdade, ninguém sabe onde nasce, nem desde quando, lá continua.
(Escrito de acordo com a anterior ortografia)