14 Mar 2023
Vítor Januário *
“Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.” É este o enunciado de parte do artigo 65.º da Constituição da República Portuguesa, que não deixa de inscrever incumbências do Estado Central e da sua relação com as autarquias para “a construção” que responda às necessidades da população.
Considerando a organização da sociedade portuguesa, fica ainda registo de que imóveis privados são estimulados “com subordinação ao interesse geral”, ou seja, a habitação, independentemente da iniciativa, deve, no território nacional, ser garantida a todos os cidadãos, independentemente do modo como se proceda, desde que se aja para o benefício geral. Contudo, nem o Estado adota “uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o rendimento familiar e de acesso à habitação própria” nem o poder local atua de forma prioritária, fazendo sobrepor o interesse geral aos interesses de particulares.
A habitação, que tem sido maioritariamente tratada como um bem manipulado no mercado disposto à especulação, teve , de facto, ações agressivas nos governos do PSD e CDS, mas também não viu alteração ao sentido mercantil a que tem estado submetida nos governos do PS. Repare-se que inquietações que surgem, neste momento, ficam à margem dos interesses das famílias de usufruírem de casa condigna, de as rendas serem suportáveis, de o cumprimento de prestações ter solução. Se, por um lado, aparenta haver mitigação de encargos com rendas, por outro, não se sustém o aumento, tal como não se inverte o ciclo de, no fim, quem lucra lucrar, ressarcindo-se bancos, mas não se assumindo, por exemplo, a possibilidade de garantir arrendamento de casa após aceitação de entrega à entidade financiadora.
Quando o propósito é a resolução dos problemas das pessoas, satisfazendo as suas necessidades pela salvaguarda de direitos fundamentais, a intervenção pública tem de ser determinada por políticas que contrariem lógicas de lucro. No fundo, a ação do governo, que não mereceu crítica local ao pacote “Mais Habitação”, segue o princípio de Lampedusa: é preciso mudar para que tudo fique como está.
O PCP empenhar-se-á junto das populações para que se exija o cumprimento da Constituição, por residência com comodidade.
* Membro da Comissão Concelhia do PCP