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Correio de Azeméis

24 Jun 2024

Nascimento póstumo: questões éticas

Carlos Costa Gomes

> Carlos Costa Gomes

Nas últimas aulas de ética e bioética colocamos a questão aos estudantes sobre o direito e a autonomia da mulher fazer nascer um filho póstumo. Isto é, depois do marido ou companheiro já falecido. 
A resposta à pergunta é simples: sim, a lei prevê essa possibilidade, o Código Civil estatui as condições necessárias para que tal se possa verificar, quando o progenitor morre e a mulher, grávida na ocasião da morte, leva a termo a gestação: o nascituro é registado como filho do falecido, os seus direitos, incluindo o sucessório, são-lhe reconhecidos. 
Uma questão inteiramente diferente é a que se formula do seguinte modo: pode um homem gerar um filho, depois de morto? Na Assembleia da República foram aprovados projetos de lei que estabelecem as condições para que seja possível, recorrendo a técnicas de procriação medicamente assistida (PMA), nomeadamente inseminação com esperma obtido em vida, criar uma gestação na mulher sobreviva; então, sim, seria gerada uma vida a partir de um morto.
Há tempos, num país anglo-saxónico, correu a notícia de uma mulher que casou pela terceira vez, já grávida de outro homem, com um senhor mais velho do que ela, cerca de 15 anos. Viveram juntos mais de uma década até que o senhor veio a falecer. Mas antes, este, havia adotado como seu o filho da mulher que casara com ele. Anos mais tarde, mãe e filho, entram em desavença por causa dos bens do falecido, que pelo facto de ser filho adotivo lhe conferiu o direito à herança juntamente com os outros filhos do falecido.
Esta história, verídica, nada tinha de excecionalidade, se esta mulher com mais de sessenta anos não tivesse recorrido à PMA – Gestação de Substituição - solicitando a uma outra mulher mais jovem, que engravida-se com o sémen do marido falecido (não sabemos como é o que o consentimento foi obtido), do qual resultou uma gravidez de gémeas, para que ela não perdesse o direito à tal herança que, por desavença com o filho, deixou de ter acesso.   
Na verdade, estas questões suscitam facilmente rejeição, até repulsa, por serem antinaturais. A técnica permite esta geração, mas mais uma vez se está a partir do ponto de vista errado de que o que é tecnicamente possível é, por isso, eticamente aceitável, um erro sempre de novo denunciado pela ética e moral. 
Fazer nascer um filho “postumo” com este propósito, só porque a técnica permite e o direito aceita, de ponto de vista ético é instrumentalizar e coisificar a vida humana na sua condição mais vulnerável. É forçoso concluir, como afirma Walter Osswald, que um morto não pode gerar um filho póstumo, pois que para que haja um filho é indispensável que haja um pai e não somente um produto biológico conservado durante meses ou anos na escuridão e no frio.
É urgente e necessário sabermos separar as águas (tal como me definiram os estudantes). Nem tudo o que a lei e a técnica permitem é aceitável. E os estudantes ao refletirem sobre este caso e outros similares, percebem bem qual o sentido ético do comportamento moral que na tomada de decisão deve prevalecer. O relativismo jurídico e filosófico, juntos, empobrecem o raciocínio moral porque tudo é aceitável mesmo o inaceitável.  

Carlos Costa Gomes, Professor de Bioética e Ética (ESSNorteCVP) e  Embaixador/Formador do PNED 

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