29 Nov 2023
Catarina Gomes *
Segundo o autor Bill Eddy, “as culturas da culpa definem o comportamento desejável, o que é indesejável mas tolerado e o que é inaceitável, a cultura define valores, status e punições para os seus elementos. Tudo isto é aprendido, mas sem que ninguém o ensine especificamente. Todas as pessoas absorvem a sua cultura todos os dias através de milhares de comentários, piadas, imagens, sussurros, estilos, fofocas, acusações, elogios e heróis, comentários depreciativos para vilões e punições sociais para aqueles que violam os valores ou a estrutura do poder da cultura.” E para com a vítima? O que acontece quando nos acontece algo que viola esses mesmos valores?
A sociedade necessita, e está sempre na busca, dos “maus”, a quem se mostra repulsa e dos “bons” a quem se mostra apoio. Esta polarização, no entanto, impede-nos de ver tudo o que está no meio. Para além de criar um estado e ambiente de constante medo, que muitas vezes nos impede de agir se não “pertencermos” a um dos lados.
Respondendo à pergunta em cima, o que por norma pode surgir quando nos acontece algo “mau” é sentirmos vergonha e culpa. A vergonha e culpa são emoções fortes que estão a comunicar connosco e que é importante não ignorar. Contudo, muitas vezes, ficamos presos nesta vergonha e culpa, que não nos permite fazer algo sobre esse mesmo acontecimento.
A vergonha é uma emoção mais social, que depende do que é ou não valorizado na comunidade onde estou inserido. Tem a ver com o que eu interpreto como comportamentos, valores e atitudes, que são socialmente esperados. Quando uma pessoa não “cumpre”, há um olhar depreciativo e de desaprovação dos outros na direção a quem não cumpriu. Se eu sei que me aconteceu algo que é “condenado”, mesmo sendo a vítima, vou ter receio de ser excluído da sociedade em que estou a viver.
A culpa é algo mais interno, fala mais sobre a sensação de “falha” sobre um comportamento que não “coube” nas expectativas da sociedade. E, muitas vezes, surge no desalinhamento entre aquilo que aconteceu, e aquilo que eu acho “certo” e que sei que esperavam de mim.
Isto mostra tudo o que pode estar a acontecer dentro da pessoa, que associado ao medo de não fazer parte, como disse anteriormente, a impede de agir. A pessoa pode ficar presa nestas emoções e ficar perdida quanto ao que fazer e, inclusive, precisar de ajuda para sair deste ciclo. Compreender esta dinâmica, entre a vergonha-culpa-medo, pode ajudar-nos a olhar, sem julgamento, para alguém que foi vítima de abuso sexual, violência doméstica, maus tratos ou mesmo quem vive numa situação que a sociedade, de certa forma discrimine, como por exemplo, as situações de separação.
Precisamos de uma sociedade com mais empatia, isto é, sentir com a pessoa, e com menos julgamento, não avaliação e antagonismo entre o bom e o mau.
“A maioria dos mal-entendidos no mundo poderia ser evitada se as pessoas simplesmente reservassem um tempo para questionarem: «o que mais pode isto significar?».” Shannon L. Adler
* Psicóloga,, Terapeuta Familiar e de Casal