29 Nov 2022
Carlos Silva *
É inegável que Oliveira de Azeméis é um concelho enriquecido em grande parte devido ao seu Património Imaterial. Neste contexto o movimento associativo assume um papel determinante no desenvolvimento sociocultural do nosso concelho, pela sua relevância e factor impulsionador no âmbito cultural, recreativo, desportivo, ambiental e social.
Felizmente temos inúmeros exemplos de dinâmicas que as associações do nosso concelho, quase todas as semanas nos apresentam nas páginas deste jornal. Se atentarmos apenas às últimas 3 edições, conto mais de duas dezenas de notícias, nos mais variados âmbitos e oriundas de várias freguesias, que demonstra que este é por excelência um assunto incontornável e quase rotineiro e que comprova claramente o fulgor e vigor de todas as associações das 19 freguesias do nosso concelho.
Muitos de nós, cidadãos, não temos a real e verdadeira noção do trabalho, esforço e sacrifício que é feito diariamente por muitas pessoas que directa e indirectamente trabalham nestas estruturas, e não fosse a criatividade e o poder de superação de todas elas, reinventando-se em atividades que lhes possam garantir fontes de receita e participando em todas as iniciativas ou eventos que se vão fazendo, hoje muitas delas teriam já desaparecido.
As associações vivem hoje do ‘estoicismo’ dos seus dirigentes, para não utilizar a palavra resiliência, já gasta e tão banalizada. Dirigentes que muitas das vezes privam-se da sua vida familiar e do conforto do seu lar, para de forma voluntariosa e desinteressada, como tem e deve ser, terem ainda de resistir à crítica pouco consciente e fundamentada, quando têm o propósito único de preservar o legado que lhes foi atribuído e exercerem com dignidade o seu papel de cidadania. Pertencer a um determinado movimento, não é uma tarefa fácil, hoje é certamente um enorme desafio, mas sem dúvida é um papel pelo qual todos deveríamos passar num determinado momento da nossa vida, para termos uma perspetiva mais assertiva da nossa vivência enquanto comunidade e sociedade.
Este é o ano em que temos exemplos de muitas associações e colectividades, que à semelhança do Correio de Azeméis, completam o seu centenário. A UDO é também um dos expoentes dessa longevidade e porventura no meio das muitas colectividades e associações que temos, a que se destaca das demais, pela sua abrangência concelhia, ou não fosse um clube multidesportivo e o clube da ‘terra’ e por ter uma modalidade mais mediática e consensual, no caso o futebol, considerado o desporto-rei no universo masculino e com cada vez mais expressão também no feminino, e que funciona como um tónico revigorante na vida cada vez mais stressante de muita gente.
Mas 2022, é também um marco único numa coletividade, que deveria e merecia ter um outro destaque no nosso concelho, fundada em 1722 a Banda de Música de Santiago de Riba-Ul, completa este ano a linda idade de 300 anos, tão somente três séculos de existência.
Desconheço o que foi feito para homenagear de forma justa esta coletividade, que para além de ser a mais antiga do nosso país em exercício, ostenta um passado glorioso e recebeu ao longo dos tempos diversas condecorações e homenagens, pelo seu enormíssimo valor patrimonial e cultural, entre as quais se destaca amplamente o título de Membro-Honorário da Ordem de Mérito, recebido do Exmo. Sr. Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, decorria o ano de 1998.
Num passado não muito distante um conjunto de Santiaguenses, e a autarquia à data, tudo fizeram para conseguir o sonho mais almejado desta coletividade, o sonho da construção de uma sede que consagrasse de uma forma digna tanta história, tantas pessoas, que reunisse o seu espólio, e que permitisse dar continuidade ao projecto de formação de músicos e consequentemente garantir a sustentabilidade e futuro desta Banda. O terreno já existia, o projecto estava executado, mas infelizmente o governo da altura ‘deitou’ por terra essa aspiração e esse sonho, ao indeferir o pedido sob o argumento que Santiago de Riba-Ul era uma freguesia urbana e os subsídios e fundos comunitários apenas eram atribuídos a freguesias rurais. O critério do espaço geográfico foi incompreensivelmente o fator decisório. Muito provavelmente, este foi um dos momentos mais tristes e negros na história desta secular coletividade e foi também das maiores injustiças que foram feitas a quem tanto lutou por ela.
Congratulo-me por alguns anos mais tarde, mais propriamente no dia 8 de dezembro de 2015, o meu Executivo, já num contexto de União de Freguesias, ter conseguido realizar em parte esse sonho oferecendo o espaço onde funcionava os serviços da Junta de Freguesia à direção da Banda, um espaço totalmente requalificado, onde esta pudesse desenvolver com mais e melhores condições todas as suas atividades. Mesmo não sendo as infraestruturas perfeitas, só quem não conheceu o reduzido espaço que até aí era ocupado pela Banda, nas suas antigas instalações bem no entroncamento da EN1, onde os músicos se encavalitavam uns nos outros nos dias de ensaio, não conseguirá reconhecer a importância desse momento.
Oliveira de Azeméis, não tem quanto sei, instituída a atribuição da Chave de Honra da Cidade, um galardão municipal destinado a distinguir personalidades, instituições ou organizações, que pelo seu prestígio, cargo, acção ou relacionamento, sejam considerados dignos dessa distinção, mas se o tivesse este seria o mais justo e merecido reconhecimento que a autarquia poderia ter, nesta data tão simbólica, para com Banda de Música de Santiago de Riba-Ul.
À falta disso, e porque 2022 ainda não terminou, lanço o desafio ao Município, para que em diálogo com a atual direção, saiba homenagear devidamente a história e todas as pessoas que contribuíram e contribuem para a grandiosidade desta instituição, dirigentes, maestros e músicos, e que também perante o poder central interceda para esse reconhecimento, porque ele tem e deve ser de âmbito nacional.
*Ex-presidente da União de Freguesias de Oliveira de Azeméis, Santiago de Riba-Ul, Ul, Macinhata da Seixa e Madaíl