8 Oct 2025
> Helena Terra
A civilização designa toda a cultura de determinado povo e o acervo das suas características sociais, científicas, políticas, económicas e culturais próprias e distintas e que, no conjunto, são a sua marca identitária e distintiva.
Este tema vem a propósito das inúmeras manifestações que têm surgido nos últimos tempos no nosso espaço público e que revelam um enorme egocentrismo, arrogância ignorante e trauliteira onde a “cacetada” é o argumento maís forte e onde a capacidade de raciocínio reside nas cordas vocais.
Aquilo a que assistimos, todos os dias, nas sessões plenárias da assembleia da república é entristecedor e revelador de que estamos a caminhar para um caminho perigoso que põe em causa a democracia conquistada há 51 anos com tanto esforço. Gente malformada e mal informada que não sabe conviver com as regras próprias da casa da democracia. O respeito pela opinião diferente do outro, a capacidade de convívio na diversidade, a tolerância e a completa falta de cultura política e democrática são gritantes. No hemiciclo, como na rua, a empatia jaz morta
Hoje, surge como natural a incapacidade generalizada de se colocar no lugar de outra pessoa, compreendendo e compartilhando seus sentimentos e perspetivas, e respondendo de forma compassiva. A empatia envolve assumir o ponto de vista alheio sem julgamento, reconhecer emoções, e comunicar essa compreensão para criar conexão, melhorar relacionamentos e promover o entendimento mútuo. Desenvolver a empatia é um processo que pode ser exercitado, contribuindo para a construção de interações sociais mais saudáveis. Empatia é necessária no local de trabalho, na escola, na rua e no espaço público partilhado em geral.
Não é possível que no recreio de uma escola, uma comunidade assista impávida e serena a dois, três ou mais jovens a agredirem um outro jovem e, pior ainda, a única atitude que assumem é a de fotografar ou filmar para fazer o primeiro post nas redes sociais.
Não é possível que num debate televisivo uma qualquer arrivista da cena política classifique de ratos outros atores da cena política ou os imigrantes que a serve à mesa de um restaurante, que cuidam dos nossos anciãos em estruturas residenciais, que construem a nossa habitação…
É execrável que alguém faça uso do direito de petição que é a garantia constitucional que permite a um indivíduo ou grupo apresentar um requerimento escrito a um órgão público para pedir providências, denunciar ilegalidades ou abusos de poder e defender direitos. Esse direito, que é universal e gratuito, pode ser exercido por qualquer pessoa sem necessidade de advogado, que é um importante instrumento de participação de cidadania e de fiscalização de poderes públicos, venha a ser usado para pedir que um estado estrangeiro mantenha em cativeiro uma cidadã nacional.
É inaceitável que se mantenha sob escuta e em investigação um juiz durante três anos, sem que o mesmo tenha conhecimento de que sobre si pende uma qualquer suspeita, sendo que, quem o faz é a entidade que em Portugal tem a obrigação de garantir a legalidade democrática e o interesse público, exercendo a ação penal, dirigindo a investigação criminal, defendendo os direitos fundamentais e representando o Estado e pessoas vulneráveis.
É esta a civilização que queremos construir?
Helena Terra, Advogada