Ser mãe no WhatsApp: a culpa em notificação contínua

Opinião Catarina Gomes

> Catarina Gomes

Entre recados da escola, fatos de treino, datas de ensaios e respostas fora de horas, os grupos de WhatsApp tornaram-se o novo campo minado da parentalidade moderna — onde é fácil sentir que se falha todos os dias.
Olho para ele, novas notificações.
Para o telemóvel. O grupo da turma, dos finalistas, da dança... Mais 36 mensagens não lidas desde o almoço. E, entre um pedido urgente da professora e a partilha de um PDF com o cartaz da festa, há também uma troca de mensagens, sugestões de lanches e alguém a perguntar para quem é mesmo o ensaio de amanhã.
Sinto que leio em diagonal. Que às vezes nem leio. Outras vezes reencaminho a mensagem para mim própria, como quem pendura um post-it mental que, invariavelmente, se perde na avalanche do dia.
E confesso: sinto-me muitas vezes uma péssima mãe por causa disto. Não porque não ame as minhas filhas, nem por falta de presença ou dedicação. Mas porque os grupos de WhatsApp das escolas e das atividades extracurriculares me fazem sentir em constante atraso, fora do tempo, sempre um passo atrás das outras mães que parecem saber tudo, lembrar-se de tudo, estar em todo o lado.
Os grupos surgiram com a promessa de facilitar a comunicação — e até cumprem esse papel em parte. Mas também se tornaram um palco de comparação invisível. Quem responde mais rápido? Quem já tratou dos bilhetes da festa? Quem tem o lanche mais saudável?
A notificação não diz só “há uma nova mensagem”. Diz também “poderias estar a fazer melhor”.
Como psicóloga, vejo este padrão espelhar-se em tantas mães (e pais): a sobrecarga invisível, a pressão de não falhar, o medo de ser a única a esquecer o dia das leggings e t-shirt preta ou de confundir a hora que tem que estar na escola para visita de estudo. É um cansaço mental subtil, mas constante — e, muitas vezes, acompanhado de culpa.
Não é raro ouvir mães dizerem: “Sinto que estou sempre a falhar.” Mas o que falha, na verdade, é o sistema: um modelo de parentalidade que exige hiperdisponibilidade, atenção dividida, e uma perfeição silenciosa mantida a partir de um ecrã.
É curioso: ser mãe sempre foi exigente. Mas ser mãe com dezenas de notificações por dia, num fluxo contínuo de informação urgente e banal misturada, é um novo tipo de desafio.
Pessoalmente, tenho tentado fazer as pazes com a ideia de que não vou conseguir tudo. Que vou esquecer recados. Que vou continuar a perguntar pela terceira vez a que horas é o ensaio. Mas também que sou uma mãe presente, envolvida, imperfeita e real. E que isso é mais do que suficiente.
Talvez o mais importante não seja acompanhar todas as mensagens, mas cultivar um espaço interno onde a parentalidade possa respirar — sem culpa, sem comparação, sem filtros.
E, se possível, com menos notificações.
  
(catarinagomesterapeuta@gmail.com)


Catarina Gomes, Psicóloga, Terapeuta Familiar e de Casal

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