13 Dec 2022
Regresso de Pindelo e Nogueira do Cravo
Segundo li nestas colunas – e é a única informação de que disponho – o problema da desagregação de freguesias parece estar resolvido. As freguesias de Pindelo e Nogueira do Cravo serão as únicas restauradas. A maior das uniões não pode ser desfeita porque é exígua a população de Madail. As freguesias de Pinheiro da Bemposta, Palmaz e Travanca continuarão unidas, embora, ao que parece, contra a vontade da maioria das três populações: venceu o “poder” de alguns, os interesses de um ou outro, a inércia e o comodismo de muitos.
(A população de Madail não é suficiente para a independência, mas, pelo pais fora, até em concelhos nossos vizinhos, freguesias com menos habitantes escaparam ao genocídio…).
A chamada “reforma Relvas”, de 2013, não foi feliz. Não resultou de qualquer estudo sério. Sem discussão ou consulta… deitámo-nos numa freguesia e acordámos numa união. E compará-la à “reforma Mouzinho da Silveira”constitui, ou acto de criminosa desonestidade intelectual, ou de manifesta ignorância. Mas a pretensa reforma de 2021 não tornou possível a correcção dos erros de 2013, gerou novas injustiças. De modo particular a dificuldade em criar uma nova freguesia, quando seria de esperar a acessibilidade à restauração quando a evidência a aconselhasse. As gerações de parlamentares de 2013 e 2021 ficarão sempre, para o bem e para o mal, associadas a esta página da história da nossa Democracia.
Mouzinho reduziu de 871 para 351 o número de concelhos, entre eles o da Bemposta, porque havia alguns tão pequenos, criados na Idade Média, que eram autênticas aldeias. Mas não aboliu uma única freguesia. Extinguiu concelhos, sorvedouros de dinheiro. Os concelhos exigiam Câmara, Conservatórias, Secretaria Notarial, Finanças, mais algumas conhecidas mordomias. As juntas acomodam-se com bastante menos. Aliás, dizem alguns bem informados que este era, inicialmente, o projecto de 2013, mas aqui, uma vez mais, parece que os fortes venceram os fracos…
Mas porque “ter ideias não é crime”, reafirmo a minha opinião sobre a matéria. E compreender-se-á que comece por Ul, a terra onde nasci.
Os dois rios que atravessam a extinta freguesia de Ul conferem-lhe uma personalidade própria, única, rios que, há séculos, estiveram na origem dos nossos moinhos, e daí do nosso famoso pão de Ul, que todos apreciam mas muito poucos defendem; legaram ainda a heróica geração de moleiros, que anos e anos numa luta cruel e desigual enfrentaram os poderes instituídos, gerando a pujante indústria de preparação de arroz e outros derivados, empresas que criam riqueza e levam o nome de Ul a vários continentes. Não esquecendo que pertence a Ul muita da área daquela que há-de ser a grande zona industrial do concelho.
Mas há também razões históricas. Eu sei que a História é hoje, para muitos, uma maçada, ciência de velhos, a escola quase a abandonou, poucos a estudam. Quando D. Afonso Henriques, em 1140, se autoproclamou Rei dos portugueses, já há milénios existia o povoado de Ul. Viviam ulenses no Crasto, que carreavam, sabe-se lá como, a água desde o Antuã. O marco miliário da milha XII, hoje erguido na Praça de São Miguel, fronteira à Matriz da cidade, que norteava em Ul os caminhantes da Via Militar Romana, foi escavado dos alicerces da velha igreja.
Uma outra união que me suscita reservas é a das freguesias de Pinheiro da Bemposta, Palmaz e Travanca.
Pinheiro da Bemposta foi, desde 1514 a 1855, sede um concelho vastíssimo que chegou a estender-se por Palmaz, Loureiro, Travanca, Macinhata da Seixa e Ul, mais Branca e Ribeira de Fráguas (Albergaria-a-Velha), Fermelã, Canelas, Salreu e Santiais (Estarreja), ainda Assequins (Águeda). Uma publicação régia de 1527, tempos do piedoso D. João III, classifica o concelho como “ um dos mais importantes da província da Estremadura”.
Com 3500 habitantes, Pinheiro da Bemposta é um autêntico museu vivo, respiramos história em todos os recantos. A extinta freguesia abandonou há muito as características de ruralidade pura e dura para avançar numa evidente urbanidade.
Banhada pelo Caima, que lhe confere cenários de conhecida beleza e paz, geradores de uma unidade hoteleira de nível nacional e internacional, Palmaz é uma freguesia dispersa, com os seus pouco mais de 2000 habitantes repartidos por 15 km2, o que lhe concede baixíssima densidade populacional. Tem características muito específicas, sem quaisquer pontos de encontro com Pinheiro da Bemposta.
Travanca é outro caso de uma terra em grande desenvolvimento, uma zona industrial a multiplicar-se, progressiva urbanidade e raro bairrismo, rasgada pelo IC 2, a dois passos da A1, onde se multiplicam as colectividades e germina a vontade de crescer.
Qual a comunhão de identidades entre os resistentes das terras de Vilarinho de São Luís, jovem “Aldeia de Portugal”, e os “agregados “ das campinas de Damonde, banhadas pelo histórico Antuã, que ali recebe as águas do Rio Ul?
Passados nove anos, alguém demonstrou já as vantagens das agregações, que alguns sapientes nestas matérias proclamam residir numa teoria chamada de “economia de escala”? E a dias do fecho do ano, onde estão as tais reuniões, as tão propaladas sessões de esclarecimento e de consulta onde todos seriam chamados a manifestar-se? Somos muitos os que ainda não deram por elas, nem receberam convites. Há freguesias das antigas onde ninguém promoveu qualquer reunião.
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O meu “debate” chegou ao fim. “Consummatum est”. O tempo vai esquecer tudo, até mesmo a possível inquietação de alguns na contestável luta pela defesa de mordomias generosamente concedidas pela agregação. É da condição humana…
Os velhos estão algo desiludidos e cansados, são evidentes o alheamento e a apatia dos jovens… e todos reconhecem - mas esquecem! - as grandes responsabilidades das formações partidárias nestas matérias.
Uma palavra final de admiração por dois cidadãos do nosso concelho. José Almeida, de Pindelo, um inconformado com a agregação que vê agora realizados os seus sonhos de independência, encontrando em Nogueira o necessário apoio, embora com desigual empenho. Também Luzia Nunes, de Palmaz, uma lutadora pela independência da sua terra e que, desassombradamente, deu-nos a conhecer algumas e pouco edificantes trapalhadas ao longo do processo.
(Escrito de acordo com a anterior ortografia)